Marcia
Duarte[1]
Roberta
Comissanha de Carvalho
Luziane
Beyruth Schwartz
Flavia
Rezende
Uma introdução à discussão sobre a qualidade da
educação científica
A história da pesquisa
em ensino de ciências, pode nos ajudar a entender
como têm sido postas questões
sobre a qualidade da educação científica. Sua origem na América do Norte, como consequência
dos
esforços empreendidos para aumentar a eficiência do ensino de ciências frente à corrida espacial na década de 50 do século XX, marca até hoje, com traços do eficientíssimo pretendido
naquele momento, tanto
a pesquisa quanto o ensino nessa
área. Desde então,
a pesquisa em Educação
em Ciências (EC) tem priorizado os aspectos metodológicos e epistemológicos
e a lógica do conhecimento científico de referência,
no sentido de garantir a
eficiência dos processos de ensino-aprendizagem. Esta característica, ainda dominante, assume a qualidade do ensino de ciências enquanto
qualidade do aprendizado, sem ver como necessária a reflexão sobre seus objetivos, assumindo-os como evidentes ou como a formação de quadros técnicos
necessários ao desenvolvimento científico e tecnológico e ao mercado. Esta falta de questionamento dos objetivos da EC parece desconsiderar a educação como campo intrinsecamente político e social, o que, por conseguinte, deixa a discussão sobre
qualidade passar ao largo desses aspectos.
É possível ver essa tendência
no ensino de física, por ter sido esta área, entre as ciências
da natureza, a precursora no desenvolvimento de
pesquisas em ensino. De
acordo com mapeamento
realizado por Rezende, Ostermann e Ferraz (2009), o estado da arte da produção nacional
sobre o ensino de física na
primeira década dos anos 2000 tem se concentrado na temática ensino-aprendizagem, apoiando-se sobre um tripé: propostas
de metodologias e estratégias de ensino, desenvolvimento de experimentos para o laboratório didático e elaboração
de recursos didáticos para a sala de aula. As autoras interpretam essa configuração da área como “a expressão de uma
visão instrumentalista da pesquisa em ensino e muitas vezes tecnicista
do processo educativo,
que
visa basicamente ao fornecimento
de subsídios ao professor para melhorar
o desempenho do aluno” (p. 5).
Considerando que, assim como a
pesquisa em ensino de física, a pesquisa em ensino de biologia, de química e de matemática também vem priorizando o aspecto metodológico, já é possível vislumbrar
um nível de conhecimento
importante no sentido de indicar direcionamentos para a qualidade da prática docente e da aprendizagem, apontando, por exemplo, a necessidade de considerar o conhecimento prévio do aluno, de mudar a visão empirista impressa no ensino de
ciências, de promover
interações dialógicas em sala
de aula e de incorporar significativamente
as tecnologias da informação e comunicação (TIC) no ensino.
Por outro lado, a área de pesquisa
em EC tem dado pouca importância às políticas educacionais
como caminho para se atingir
a qualidade. É notável que, nos eventos
científicos da área, o número de trabalhos
sobre essa temática
seja sempre frequentemente muito baixo ou até nulo. A falta de reflexão acadêmica sobre as políticas educacionais tem
tido como consequência o fato de que, em muitas pesquisas, documentos oficiais tais como os Parâmetros
Curriculares Nacionais para o Ensino Médio (PCNEM), por exemplo, sejam citados para validar ou justificar o trabalho ou até como
referencial
teórico, voltando-se em qualquer um desses casos, para o
atendimento e divulgação das propostas
educacionais do
governo (REZENDE; OSTERMANN, 2005).
Neste sentido, é
fácil perceber o quão frequentemente os conceitos de interdisciplinaridade, competências, habilidades e contextualização têm assumido
papéis importantes nas pesquisas em
ensino de ciências e sido vistos como sinônimos
de qualidade. Por meio dos conceitos
de contextualização
e competências, seria difundida
a ideia de que a educação deve servir de ferramenta de inserção
social, vinculando-se ao
mundo produtivo, sem a preocupação,
entretanto, com os questionamentos de como se constituiu
ou se constitui este mundo. Como consequência, tem-se observado que muitos professores entendem o princípio da contextualização como a abordagem
descritiva de situações do cotidiano
e de fenômenos
da natureza com a linguagem científica, deixando de explorar as dimensões sociais, políticas
e culturais nas quais esses
fenômenos estão inseridos (SANTOS, 2007).
Entendemos que, embora toda
a produção da área
dedicada à investigação do processo
de ensino-aprendizagem possa ser considerada um passo importante na direção da qualidade, não há como desvincular a reflexão sobre a qualidade do ensino de ciências da reflexão sobre seus
objetivos. Chassot (1998), por exemplo, alerta para o fato de que, sendo a educação um processo político
e ideológico, a educação
científica poderá tanto
preparar o indivíduo para a
utilização racional
do conhecimento científico e tecnológico para buscar o bem da coletividade, como para explorar
o conhecimento apenas a fim de obter benefícios
pessoais, independentemente das consequências sociais e ambientais
de tal atitude. Lemke (2006) defende a reorientação do currículo de ciências para questões e problemas
sociais que terão de ser enfrentados por toda a humanidade
no século XXI, como,
por exemplo, a crise
ambiental e a injustiça
social, visando a uma sociedade melhor
e uma vida mais satisfatória para as pessoas. O autor acredita
que
legisladores e protagonistas da EC devem tomar atitudes políticas e morais ou seremos julgados, seja pelos estudantes, seja pela história, como socialmente irresponsáveis. Apesar de defendida por alguns pesquisadores, esta orientação está longe de ser realizada, como alerta Banet (2007),
para
quem é evidente que a formação recebida pelos estudantes no ensino secundário, centrada nos conceitos e leis próprios das disciplinas, não atende às necessidades da sociedade atual e deixa de lado outros âmbitos
formativos importantes, como, por exemplo, os processos que caracterizam a atividade científica. Assim, para este autor, nem se efetiva uma
EC satisfatória,
nem se atendem às necessidades formativas dos cidadãos na atualidade.
Os estudos sobre as abordagens curriculares
com ênfase na relação Ciência-Tecnologia-Sociedade (CTS) são a linha de pesquisa
da área que prioriza a qualidade
política da ciência
e da educação. Estes estudos
defendem um currículo que explore a relação entre ciência, tecnologia e sociedade, e apontam,
como sua principal
proposta, a preparação
dos estudantes para o exercício da cidadania (SANTOS; MORTIMER, 2002). Estes autores alertam, por
outro lado, que uma reforma curricular
com ênfase em CTS
implica mudanças de concepções do papel da
educação e da EC, ou
estaremos incidindo no erro
de, simplesmente, maquiar os currículos atuais com pequenas
aplicações de temas sociais do cotidiano.
Moreira e Kramer (2007) se voltam para a concepção de qualidade
da
educação centrada na realidade
do Terceiro Mundo, e consideram
o conhecimento escolar apropriado
aquele que possibilita ao estudante tanto um bom desempenho no mundo
imediato quanto a análise e a transcendência de seu universo cultural.
Para os autores, relevância da educação diz respeito “ao potencial que certos conhecimentos e processos
pedagógicos apresentam de tornar as pessoas aptas a definir o papel que devem ter na mudança de seus ambientes e no desenvolvimento da sociedade” (p. 1045).
Diante das diversas possibilidades de se correlacionar o ensino de ciências com concepções de qualidade
da educação e da
necessidade de se avançar
nesta discussão,
consideramos importante trazer, para o debate, os reais
protagonistas do cenário
educacional, procurando compreender como professores das ciências de diferentes realidades educacionais e das diferentes disciplinas científicas constroem discursos sobre as políticas
educacionais, a ciência, o currículo, a avaliação, os objetivos educacionais, as
TIC e como relacionam estes discursos à qualidade da EC que realizam ou sonham realizar.
Assim, investigamos a qualidade da
educação científica a partir da compreensão da educação como mediação
sociocultural e da análise do discurso de agentes do ensino de ciências em
diferentes contextos educacionais.
Neste
capítulo, apresentamos a síntese de quatro estudos
desenvolvidos no âmbito de um projeto[2] de
pesquisa em rede, que tiveram como objeto as perspectivas de qualidade de professores de nível médio das
redes privada, estadual e federal do Rio de Janeiro. A partir da análise bakhtiniana do discurso, realizada com a
ajuda de um dispositivo elaborado especificamente para tal, foi possível apreender uma diversidade de
perspectivas sobre
a educação científica e correlacioná-las a sentidos de qualidade.
O quadro teórico-metodológico: a perspectiva sociocultural
A perspectiva sociocultural (WERTSCH, 1993) nos pareceu
adequada para problematizar a questão da “qualidade” tendo em vista a natureza
polissêmica dessa palavra, isto é, o quanto a mesma depende da atribuição de
sentidos pelos sujeitos. Ao propor a aproximação à ação humana a partir dos
gêneros discursivos como instrumentos mediadores, Wertsch (1993) estabelece
diálogo com constructos analíticos que possam ir além dos cenários
psicológicos, relacionando as atividades mentais à linguagem. Em sua obra, o
autor inicia esta expansão relacionando o funcionamento mental com a linguagem
e busca na translinguística de Bakhtin os constructos para elaboração de uma
teoria sociocultural.
Bakhtin (2004) buscou compreender as questões
epistemológicas das ciências humanas e sociais, considerando a linguagem como
elemento organizador da vida mental e fundamental na formação do sujeito
histórico-social. Assim, a linguagem não exibe apenas sua propriedade de
veículo de transmissão de conteúdo, mas possui uma dimensão constitutiva de
formas de pensar e significar.
Na contramão das grandes correntes teóricas da
linguística que predominavam até então, Bakhtin (2004) considerou o enunciado
como produto da interação social e como a verdadeira unidade de análise da comunicação
verbal. O conceito de voz em Bakhtin (2003) não se refere a sinais
auditivo-vocais, mas a questões mais amplas da perspectiva do sujeito falante,
seu horizonte social, sua intenção e sua visão de mundo. Este conceito enfatiza
o pressuposto bakhtiniano de que a atividade mental a exprimir, a estrutura da
enunciação e sua elaboração estilística são de natureza sociológica (BAKHTIN,
2004).
Para analisar as enunciações buscando a construção de
sentido é preciso recorrer à noção de dialogia, conceito-chave em Bakhtin
(2004), que pressupõe que em todo enunciado há, pelo menos, duas vozes, mesmo
que não haja interação face a face. Quando um sujeito fala, o faz referente a
algo ou a outra voz. Mesmo que um enunciado não esteja respondendo de alguma
maneira a enunciados anteriores, ele antecipa as respostas de outros enunciados
que se seguirão. O interesse de Bakhtin (2004) pela direcionalidade do
enunciado envolve tanto o interesse por quem produz o enunciado como a quem
esse enunciado é dirigido. Nesse sentido, o ato de compreender não é apenas
decodificar um conteúdo, mas requer do interlocutor uma ação ativa e reativa,
porque “para cada palavra da enunciação que estamos em processo de compreender,
fazemos corresponder uma série de palavras nossas” (BAKHTIN, 2004, p. 132).
Quanto maior o número e o peso dessas palavras, mais profundo e substancial
será nosso entendimento.
Os enunciados e os significados dos enunciados estão
intrinsecamente inseridos num contexto sociocultural e, por isso, são permeados
de influências socioculturais: pela direcionalidade dos enunciados (para quem
falamos ou a quem nos referimos), pelo contexto em que esses enunciados são
produzidos (na escola, em casa) e pela função que esses enunciados desempenham
(uma petição, uma carta pessoal). Bakhtin (2003) abordou a situacionalidade do
enunciado no conceito de gênero discursivo. O gênero discursivo é assim, um
tipo de enunciado que se caracteriza em função de situações típicas de
comunicação verbal, ao contrário da linguagem social que é um tipo social de
fala associada a um extrato específico da sociedade (segundo profissão, faixa
etária, etc.). Logo, a produção de todo enunciado implica a apropriação de pelo
menos uma linguagem social e um gênero discursivo, porque esses tipos sociais
de fala estão situados socioculturalmente (WERSTCH, 1993). Sendo de natureza
social, a enunciação é, portanto, ideológica e não existe fora de um contexto
social.
A resposta à pergunta “quem está realizando o ato da
fala?” (WERTSCH, 1993, p. 83) implica, do ponto de vista bakhtiniano, sempre
pelo menos duas vozes, o que acentua a produção do significado não no indivíduo
isolado, mas na vida grupal. A compreensão de como as linguagens sociais e
gêneros discursivos se relacionam na composição dos enunciados é indispensável
para a análise de como diferentes vozes se põem em contato.
O conceito de dialogia responde pela relação entre o
falante e o enunciado de outros. Assim, fazer uso da linguagem requer
apropriar-se das palavras do outro e torná-las, em parte, nossas. Isso porque
não existe uma linguagem neutra e impessoal, disponível para ser usada, mas
para torná-la própria é preciso tomá-la dos contextos e das intenções dos
outros. Mais especificamente, o que define apropriação é a ação que vai além do
contato com outras vozes ou com outros discursos, é “trazer algo para o
interior de si mesmo e fazê-lo próprio” (WERTSCH, 1999, p. 92) acrescentando
intenção semântica e expressividade próprias, dando voz à sua manifestação
discursiva e promovendo sua reconstrução. Por este processo, o sujeito amplia o
domínio de um discurso, incorporando novos horizontes de compreensão e de
participação.
Na relação do falante com seu próprio enunciado, Bakhtin
(2003) chama atenção para o conteúdo semântico referencial e o aspecto
expressivo do sujeito que, para Wertsch (1993), seria equivalente à ideia de
perspectiva ou de ponto de vista sobre o conteúdo do enunciado. Segundo o
autor, a partir destes processos dialógicos é possível encontrar diferenças
entre os enunciados de uma linguagem social e os de outra.
Na construção de sua perspectiva
sociocultural, Wertsch (1993) defende, para
além da relação com a linguagem enquanto ferramenta mediadora da vida
mental, uma perspectiva interdisciplinar que possa estabelecer contato frutífero
com constructos analíticos das ciências sociais e ciências humanas. O autor aponta
as ciências sociais como um caminho para a expansão da teoria sociocultural e inicia
esta aproximação ao considerar os conceitos de capital cultural e de reprodução
(BOURDIEU apud WERTSCH, 1993) como ferramentas que têm “implicações óbvias para
uma explicação de gêneros discursivos que dão forma ao discurso e ao
pensamento” (p. 168).
Procurando avançar neste sentido, buscamos expandir o
quadro teórico bakhtiniano, incorporando constructos da sociologia da educação
à perspectiva sociocultural por meio do pensamento de Bernstein (1996),
referencial do quarto estudo. Encontramos na teoria do discurso pedagógico de
Bernstein um referencial potente e pertinente, capaz de dar suporte à
compreensão das relações que queremos investigar. Ao realizar uma análise
crítica do currículo e do processo de escolarização, Bernstein colocou em
questão o papel da educação na reprodução cultural das relações de classe,
tornando evidente que a pedagogia, o currículo e a avaliação são formas de
controle social (MAINARDES; STREMEL, 2010). A partir dessa crítica, o autor
constrói uma teoria complexa, com base, principalmente, nos conceitos de
código, dispositivo pedagógico, discurso pedagógico, nos princípios de
classificação e enquadramento e no processo de recontextualização.
Sua teoria do dispositivo pedagógico examina o processo
pelo qual uma disciplina é transformada para compor o conhecimento escolar, o
currículo, os conteúdos e as relações a serem transmitidas. Este dispositivo se
constitui de um conjunto de regras discursivas hierarquicamente relacionadas,
classificadas em distributivas (que se aplicam ao campo intelectual do sistema
educacional), recontextualizadoras e avaliativas. Essas regras, que regulam a
comunicação pedagógica, estão relacionadas a três diferentes campos: o campo de
produção do discurso, o campo recontextualizador e o campo de reprodução do
discurso. Através das regras discursivas, o dispositivo pedagógico fornece a
gramática intrínseca do discurso pedagógico que, para o autor, é muito mais que
o conteúdo a ser ensinado ou que uma seleção de enunciados. O discurso
pedagógico seria um princípio de recontextualização de outros discursos que
serão seletivamente transmitidos e adquiridos.
Os processos de recontextualização consistem na passagem
de um discurso de seu contexto original de produção para um outro contexto,
onde é modificado, relacionado a outros discursos e assim, reposicionado. Essa
movimentação produz uma mudança no discurso por conta da influência da
ideologia, sujeita a diferentes visões de mundo e aos interesses especializados
e/ ou políticos dos agentes recontextualizadores, cujos conflitos estruturam o
campo recontextualizador, intermediário entre o campo de produção e o campo de
reprodução do discurso, as escolas. Entre os campos recontextualizadores,
destacam-se o Estado e suas agências e o campo recontextualizador pedagógico,
constituído por departamentos e faculdades de educação, suas pesquisas,
publicações, leitores e editores. Quando um discurso é apropriado por agentes
dos campos recontextualizadores, em geral ele é deslocado e depois realocado
segundo um novo posicionamento ideológico. Uma vez no campo de reprodução,
quando se torna ativo no processo pedagógico, o discurso sofre novas
transformações e reposicionamentos.
O discurso pedagógico resultante destes processos é
visto não apenas como texto ou fenômeno linguístico, mas articulado às práticas
e identidades dos sujeitos, submetido a mudanças e constituído enquanto
repertório que conforma as relações sociais. O discurso pedagógico seria assim,
um conjunto de normas que regula a produção, reprodução, distribuição,
transmissão, aquisição, avaliação e inter-relação dos textos, incluindo
qualquer representação expressa pela fala, pela escrita, visualmente,
espacialmente, nas posturas assumidas, na maneira de vestir, as quais expressam
materialmente as relações sociais. Não há como identificá-lo com o conhecimento
das matérias, já que se configura pela ligação de dois discursos: o discurso
instrucional e o discurso regulativo. O discurso instrucional se refere aos
conhecimentos mais específicos (o que e como transmiti-los) enquanto o discurso
regulativo tem cunho ideológico (discurso moral e de transmissão de valores e
identidades), é regulador do discurso instrucional e determinante na ordem
social.
Nos primeiros
três estudos apresentados a seguir, utilizamos um dispositivo
analítico que procura refletir a apropriação teórica da obra de Bakhtin por
meio das seguintes etapas: (i) Identificação
do enunciado: a própria alternância entre os sujeitos falantes é
suficiente para identificar o enunciado, ou seja, o enunciado inicia-se no
momento em que o falante toma a palavra para si e finaliza-se no momento em que
este termina o que gostaria de dizer, permitindo que o outro também fale; (ii) Leitura preliminar do enunciado:
nesta etapa tem-se o primeiro contato com os enunciados a serem analisados, no
sentido de identificar preliminarmente seus elementos linguísticos (estilo,
construção composicional, unidade temática, relação com o falante/outros
participantes, conclusibilidade) e fazer uma articulação prévia entre o
material linguístico, as questões de pesquisa e os conceitos bakhtinianos;
(iii) Descrição do contexto
extraverbal: a partir da leitura preliminar e da articulação prévia das
questões de pesquisa aos conceitos bakhtinianos, é realizada uma investigação
do contexto extraverbal para identificar, dentre os vários elementos, aqueles
que mais contribuirão para a análise. Esses elementos são então descritos e
articulados com vistas a estabelecer o horizonte espacial comum dos
interlocutores, seu conhecimento e compreensão da situação, a avaliação comum
dessa situação, o momento social e histórico em que ocorre e a rede de
enunciados a que se relaciona. Nesta etapa também são trazidos os contextos
individuais dos sujeitos enquanto autores-pessoas, como por exemplo, formação,
tempo de atuação profissional, instituição em que atua, idade, região e Estado
da federação a que pertence, etc. Estes dados poderão ajudar a compor o
entendimento dos enunciados, considerada a relação de aproximação entre ambos;
(iv) Análise do enunciado: consiste
em articular os elementos linguísticos, o contexto extraverbal e os conceitos
bakhtinianos envolvidos para responder as questões de pesquisa. Na
interpretação das perspectivas dos professores, levamos em consideração tanto a
situação atual de enunciação e portanto a direcionalidade dos enunciados quanto
aspectos de sua formação e do contexto educacional e sociocultural específico ao
qual o professor se reportava. Nessa etapa, a descrição do contexto extraverbal
poderá ser revista e ampliada, caso seja necessário buscar mais elementos para
melhor compreensão do enunciado.
No quarto estudo, que considera os conceitos teóricos de
Bernstein como referencial, realizamos
a análise do discurso dos professores entrevistados em duas etapas: (i) localizamos
processos de recontextualização das políticas curriculares quando os
professores se manifestaram em relação aos documentos oficiais e aos processos
de seleção e legitimação do conhecimento escolar; e processos de
recontextualização de outros discursos correntes no meio educacional quando
relacionavam aspectos pedagógicos, políticos, sociais, educacionais à qualidade;
(ii) buscamos descrever como, ao serem realocados de um contexto para outro,
por meio de processos de recontextualização, estes discursos dão origem ao
discurso pedagógico de cada professor e tecem sentidos de qualidade para a
educação científica.
Perspectivas de professores de nível médio sobre qualidade da educação
científica
Apoiados na
perspectiva sociocultural, analisamos inicialmente, as enunciações de
professores das ciências da natureza e de matemática participantes de um grupo
focal que promoveu a discussão sobre a qualidade do ensino de ciências. Nove
professores de nível médio que lecionavam em escolas públicas e privadas do Rio
de Janeiro (cujos nomes são fictícios) participaram deste estudo: um professor de
química de uma escola privada (Paulo); um professor de química de uma escola
prisional, uma escola pública e uma privada (Júlio); um professor de matemática
de uma escola pública (Ronaldo); um professor de física de uma escola pública
(Marcelo); uma professora de física de uma escola particular (Gabriela); uma
professora de química de uma escola técnica pública (Fátima); uma professora de
matemática de uma escola pública (Tatiana); um professor de biologia de uma
escola pública (César) e uma professora de biologia de uma escola pública de
formação de professores (Ana).
A partir da transcrição da gravação em vídeo, analisamos
os enunciados de todos os professores, - considerados como sua fala ou turno, cada vez que se
dirigiam à mediadora ou ao grupo -, com o objetivo de identificar os sentidos atribuídos
por eles à qualidade da EC. Como a mediadora sugeriu inicialmente um tema amplo
e em seguida o debate sobre a qualidade, que como já vimos anteriormente é uma
palavra de caráter polissêmico, os professores acabaram elegendo temas diversos
em ambos os momentos da atividade. Por meio de enunciados longos, abordaram, em
geral, mais de um tema, que consideramos como subtemas dos temas mais amplos.
Na primeira etapa da análise foi necessário, assim, identificar os subtemas que
compunham o conteúdo semântico referencial dos enunciados dos professores. Buscamos
então, a relação do falante com seu enunciado, ou seja, a identificação das
vozes dos professores, considerando-as como perspectivas referenciais (WERTSCH,
1993) sobre aquele(s) subtema(s). Para identificá-las, inferimos qual era o
ponto de vista do falante, como e por que o tema foi relacionado com qualidade.
Ainda que não aparecesse a palavra qualidade nas falas dos professores,
buscamos identificar a posição valorativa dos professores frente ao ensino de
Ciências e Matemática, bem como à educação stricto sensu.
Para defenderem
suas perspectivas, os professores construíram seus discursos a partir do
diálogo com diversas linguagens sociais. A linguagem social que parece
dominante, quando se referem aos problemas curriculares, de aprendizagem dos
alunos e à prática pedagógica, é o discurso que circula na sua escola, no grupo
social que compartilha a atividade de ensinar naquele determinado
contexto educacional. Diferentes realidades educacionais moldaram as linguagens
sociais dos professores e, consequentemente, suas concepções sobre o currículo,
finalidades da educação e qualidade.
Embora possa haver
consensos, essa diferença se desdobra, em geral, em tensões entre as
perspectivas. Assim, foi possível observar que Paulo, professor de uma escola
privada, questiona menos o currículo e vê a qualidade do seu ensino como
sinônimo de melhor desempenho do aluno no vestibular. Este professor se exime
de uma reflexão mais profunda que, de fato, poderia levá-lo a questionar currículo,
avaliação, políticas educacionais, vestibular etc. Fátima diferencia sua voz
pelo pertencimento a uma escola técnica pública, que considera superior em
termos de qualidade devido à seleta clientela que recruta. Já entre os
professores de escolas públicas, percebemos diferentes vozes que nos pareceram
diferenciadas pelo tempo de experiência profissional.
A falta de
qualidade do ensino de ciências está ligada, para a maioria, ao anacronismo do
currículo e da escola frente ao cotidiano dos alunos, sendo a presença
avassaladora da tecnologia no ambiente social o fator que mais o deixa evidente.
Na discussão, foi possível perceber uma tensão entre os professores que
acreditam que tecnologizar o ensino de ciências o salvaria desse anacronismo e
outros que afirmam que apenas isso não bastaria. Para os que defendiam a
inserção tecnológica, a defesa da educação científica com uso das tecnologias
foi frequente, mas também esteve presente a ideia de se abordarem os artefatos
tecnológicos como contexto para a aprendizagem, assim como prescrevem os PCNEM.
Perspectivas sobre a questão curricular também foram
tensionadas entre seguir o currículo visando os exames oficiais ou mudar o
currículo para atingir objetivos alternativos. Nesta tensão, houve a
preocupação em favorecer a aprendizagem de Ciências, mas também a socialização
dos alunos e a construção de um conhecimento útil à sua realidade. A discussão
foi polêmica entre o grupo, que entendeu que estas possibilidades poderiam
levar a finalidades distintas: à formação científica exclusivamente voltada
para o ensino superior ou a uma formação científica útil e de qualidade para
todos. Entre os que recontextualizam o currículo oficial, Júlio diz-se
comprometido com um ensino de ciências de qualidade, mas que se afasta do
cumprimento de um mesmo currículo ou metodologia de ensino para todos os
alunos, independentemente do contexto. Já Marcelo não segue o currículo porque,
para ele, os alunos da escola pública não conseguem ou não podem aspirar ao
ensino superior, visto que a qualidade do ensino que recebem não lhes permite
tal acesso e que a meta final desses alunos é o mercado de trabalho.
Com relação ao
trabalho docente, percebemos uma tensão entre a prática que endossa a ausência
de qualidade, caracterizada pela falta de mobilização e comprometimento, e
outra que se coloca como militante pela qualidade, apesar da escola, do
salário, das condições de trabalho. Diante da situação de sucateamento do
sistema educacional, relatada por diversos professores do grupo, os professores
se debatem entre a impotência para resolver os problemas que se apresentam e a
atitude que assumem para si quanto à necessidade de mudança. Estes acreditam
que o nível de comprometimento do professor com a aprendizagem dos alunos, ao
refletirem sobre sua prática docente e se utilizando de novas metodologias,
pode garantir a qualidade do ensino. Essa visão atribui, ao indivíduo, o
alcance da qualidade, sem reconhecer que um real interesse do poder público em
investir na qualificação e remuneração
dos profissionais da educação possibilitaria o
comprometimento de um número expressivo de professores.
Para Ronaldo e
César, que têm mais tempo de magistério, o sucesso seria atingido pelo
interesse do aluno, estimulado pelo ensino anterior à Lei 5.692/71 (BRASIL,
1971). Ao dialogarem com o discurso oficial daquela época, em que a maioria dos
alunos pertencia à classe média e, em função disso, trazia capital cultural
diferente dos alunos de hoje, esses professores não reconhecem a seletividade
que estava embutida no sistema educacional e, por isso, são capazes de
valorizá-lo. Ao defender o jubilamento como prática que poderia contribuir para
a qualidade do ensino, Ronaldo parece aceitar a exclusão como resultado
educacional, sem problematizar o contexto sociocultural e o sistema
meritocrático em que este tipo de prática se insere.
Ao mesmo tempo,
Ronaldo e César denunciam o recrutamento de estudantes de todos os níveis e
interesses como a causa da falta de qualidade do ensino atual, sem perceber que
o sistema deveria dar as condições para lidar com este público diversificado e
muito mais amplo. Ana também culpabiliza a inclusão de alunos, antes excluídos,
pela queda da qualidade do ensino, não reconhecendo, nessa inclusão, um avanço
da qualidade da educação no que diz respeito à democratização das oportunidades
de acesso escolar e de possível ascensão social.
O fracasso na
aprendizagem de ciências se daria, segundo as diferentes vozes dos professores,
pela falta de base, de interesse ou de prazer. Estas questões, envolvidas na
complexidade do ato educativo e originadas no contexto sociocultural mais
amplo, precisam ser aprofundadas. O desinteresse dos jovens pelas ciências da
natureza tem assumido dimensões preocupantes em vários países. Para Fourez
(2003), os educandos não se interessam por estudos científicos impostos pelo
sistema educacional - que visam a
interesses apenas da comunidade científica ou do mundo industrializado - porque os percebem como
desarticulados dos problemas de sua realidade. Além do desinteresse, Lemke
(2006) aponta a própria exclusão produzida pelo ensino de ciências ao longo das
últimas décadas, por ter sido impulsionado pelo interesse político na formação
da força de trabalho técnica e cientificamente preparada.
No que diz respeito
às políticas educacionais, a política de aprovação automática do município do
Rio de Janeiro, vigente até 2008, foi muito mencionada e criticada. A política
do governo do Estado do Rio de Janeiro de distribuição de laptops aos
professores também foi mencionada e igualmente criticada. A perspectiva dos
professores em relação a estas políticas pode ser considerada um ponto positivo
na medida em que demonstraram um posicionamento crítico em relação à associação
governamental entre elas e a qualidade do ensino.
Embora os
professores não tenham mencionado explicitamente os PCNEM, foi possível
perceber que os conceitos fundamentais que alicerçam o ensino de ciências
(contextualização, interdisciplinaridade e competências e habilidades)
estiveram presentes nos enunciados de Paulo, Júlio, Gabriela, Fátima e Tatiana.
Relacionar os conteúdos com o cotidiano dos alunos, com a tecnologia ou a
atualidade passou a ser um objetivo relevante para o professor das ciências.
Entretanto, não foram percebidos questionamentos em relação a esse conceito que
implicassem diferentes abordagens do mesmo, como, por exemplo, a ideia de ir
além do entendimento de um fenômeno presente na realidade, abordando suas
dimensões sociais, políticas e culturais, como sugere Santos (2007).
A tensão entre
seguir o currículo das disciplinas científicas, tal como previsto pela
legislação ou pela escola, e alterá-lo de acordo com determinada realidade educacional
ou social dos alunos permeou o discurso dos professores pesquisados, mesmo que
de modo diferenciado entre eles. Enquanto alguns criticaram o acesso ao nível
superior de ensino como a meta educacional a ser alcançada, outros defenderam a
contextualização e atividades alternativas como atributos positivos e
motivadores do processo ensino-aprendizagem. Os primeiros entendem estas
práticas como algo negativo que pode comprometer a qualidade do ensino, dada a
enorme quantidade de conteúdos a serem abordados nas disciplinas científicas.
Uma conclusão da
análise aponta para a recorrência do sentido da falta de qualidade atribuída à
educação pública e privada e, em particular, ao ensino de ciências. Esta falta
de qualidade foi atribuída a problemas pedagógicos e políticos. Por meio da
denúncia da falta de qualidade, o discurso dos professores deixa pistas sobre o
que seria a suposta qualidade.
Em geral, os professores investigados se manifestaram
sobre os elementos pedagógicos da EC se utilizando da linguagem social típica
de sua vivência escolar, em enunciados apartados daqueles nos quais se referiam
aos aspectos políticos, construídos em diálogo com a legislação educacional.
Percebemos que, embora os professores reconheçam relações entre a educação e a
esfera política, não parecem reconhecer o caráter político inerente ao ato
educativo, ou à educação científica em particular, manifestado em suas
finalidades, proposta curricular, metodologias etc. Também não percebemos a
preocupação com sua implicação na reprodução ou transformação da sociedade.
Enquanto alguns professores atribuíram o
problema da qualidade da educação a questões relacionadas às más condições de
trabalho, à desvalorização docente, aos baixos salários e ao sucateamento do
sistema educacional como um todo, na fala de outros, ainda que inseridos nesta
mesma realidade, percebemos a ilusão de que a qualidade pode ser atingida por
iniciativas individuais. Também percebemos no
discurso político dos professores, a dicotomia qualidade versus quantidade,
envolvida na questão da qualidade da educação. Enquanto alguns permanecem com o
discurso conservador que privilegia a qualidade para poucos em detrimento da
democratização do acesso à escolaridade, outros, mesmo reconhecendo que a
massificação desse acesso alterou num primeiro momento a qualidade do ensino,
apostam na qualidade da educação como direito de todos.
Apesar das
diferenças entre os contextos educacionais e entre as linguagens sociais com as
quais os professores dialogaram, podemos apontar um sentido negativo de
qualidade, atribuído por todos eles, à educação científica. Concluímos que a
complexidade da nossa sociedade incide diretamente sobre todas as tensões e
perspectivas identificadas, se desdobrando nos sentidos que os professores
atribuem à educação, ao ensino de ciências e a todos os elementos que o
conformam. Ao lado de outros problemas sociais, os problemas da educação se
agravam em meio ao descaso com que ela ainda é tratada pelos que poderiam e
deveriam agir em prol da melhoria de sua qualidade.
Perspectivas sobre a qualidade do ensino de ciências na educação profissional
Desde o segundo mandato do presidente Lula e ao longo do
governo Dilma, a formação profissional, no âmbito federal e estadual, tem sido
implementada como política de promoção da qualidade da educação. Medidas
políticas e modalidades de oferta para os diversos níveis de ensino têm
assinalado a centralidade da formação profissional nesse período.
Historicamente, a educação profissional (EP) vem se
constituindo em um campo no qual estão em disputa interesses governamentais,
empresariais, de instituições internacionais e, em particular, da esfera
acadêmica, que luta para reverter a concepção adestradora e tecnicista
profissional que, de um modo geral, desde muito caracteriza os processos
formativos profissionais no Brasil. A preocupação da comunidade acadêmica em
relação à EP que nesta década recebe atenção prioritária do governo, é a forma
como ela vem se constituindo, tanto pela manutenção de seu caráter privado (até
2008, cerca de 80% da educação profissional estava nas mãos da iniciativa
privada) como por sua orientação pela Diretrizes Curriculares Nacionais para a
Educação Profissional Técnica de nível Médio (EPTM), que parecem insistir em
uma regressão ao Decreto 2208/97.
A problemática que motiva o presente estudo, portanto, é
tecida pelos embates políticos vivenciados nas últimas décadas pela EP no cenário
educacional brasileiro. Nesse embate, circulam referenciais de qualidade que
norteiam a educação científica e orientam as práticas dos docentes que atuam
neste contexto educativo, entre eles, a concepção de educação politécnica, que
possibilitaria o acesso à cultura, à ciência e ao trabalho, eixos centrais da
formação integral, concebida por vários autores como um salto de qualidade para
a EP.
Realizamos entrevistas com seis professores de nível
médio de duas escolas públicas de educação profissional do Rio de Janeiro
(quatro de Química, da escola A e dois de Biologia, da escola B), a fim de
apreender sentidos atribuídos à qualidade da educação científica. A partir de
uma análise “bakhtiniana” dos enunciados dos professores foi possível chegar a
uma diversidade de perspectivas de qualidade, dentro de um contexto educacional
tão particular como o da EP. Essa diversidade é maior na escola A, mesmo quando
consideramos um mesmo campus. Na escola B, encontramos mais aproximações do que
afastamentos entre as perspectivas de qualidade enunciadas pelos sujeitos
entrevistados. Essa síntese é capaz de mostrar que a atuação do professor na EP
não produziu necessariamente uma visão hegemônica de qualidade para a educação
científica, assim como o contexto institucional não produziu uma única visão de
qualidade em cada instituição.
A pesquisa permitiu vislumbrar diferenças no processo de
apropriação das orientações político-pedagógicas pelas instituições
educacionais investigadas, sinalizadas pela maior dispersão entre as
perspectivas de qualidade encontradas na escola A em relação à escola B, ainda
quando levamos em conta um mesmo campus. Os professores da escola A
reconheceram que não conheciam o projeto pedagógico da escola, não utilizavam e
não havia discussões coletivas. As perspectivas de qualidade encontradas são,
assim, fruto da assimilação de um possível senso comum sobre o conceito de
formação profissional que circula nas instituições educacionais, ancorado em
legislações passadas, na formação acadêmica do professor ou até na mídia. Além
disso, alguns criticaram o direcionamento pedagógico da escola e vários outros
aspectos curriculares e ideológicos. A relação discursiva dos professores da
escola B com o projeto político pedagógico é completamente diferente. Ambos
mencionaram aspectos do projeto, sempre se manifestando positivamente. Um deles
teceu elogios e se disse fã da escola.
Essa diferença nos contextos institucionais das escolas
pode estar na origem da maior diversidade de perspectivas entre os professores
da escola A. Enquanto a escola B promove a discussão do currículo, do projeto
pedagógico e da legislação, permitindo o embate de perspectivas, mas também a
construção coletiva e a adesão dos professores a um projeto comum, a escola A
não promove atividades que levem ao compromisso com um projeto coletivo.
Consideramos um caminho importante tomar esse resultado como uma hipótese a ser
perseguida em estudos futuros.
Diante dos nossos achados, também é possível considerar
que a formação acadêmica tenha influenciado ideologicamente a visão de Ciência
enunciada pelos professores entrevistados. Na escola A, os professores com
formação pós-graduada em Educação apresentaram uma visão crítica à ciência
positivista, enquanto aqueles que não tinham tal formação, não se posicionaram
criticamente. Entretanto, essa relação não se confirma na escola B, já que o
professor crítico não tem este nível de formação. Interpretamos que o papel que
a formação acadêmica desse professor tem em moldar sua perspectiva de qualidade
foi sobrepujado pelo compromisso do professor com o projeto pedagógico da
escola. A discussão coletiva, o compartilhamento de ideais e de valores (neste
caso, críticos) moldaram as perspectivas de qualidade da educação científica
(neste caso específico, a visão de ciência) igualmente ou mais fortemente do
que sua formação acadêmica.
Em relação às finalidades do ensino de ciências, foi
possível perceber a complexidade dialógica que pautou a construção dos sentidos
apreendidos, envolvendo confrontos de atribuições valorativas com as demandas
efetivas do contexto de trabalho e com as expectativas de um ensino de
qualidade alinhadas com outros discursos. Identificamos dialogias tecidas a
partir de pontos de contato com os discursos circulantes na escola, com os
discursos oficiais, institucionais e acadêmicos.
Observamos, também, diferentes pontos de partida que os
professores elegeram para tecer a sua perspectiva de qualidade. Alguns tomaram
por referência as ações da própria instituição para legitimar ou não as
finalidades do ensino, respondendo ativamente com críticas, comparações,
acordos e desacordos. Notamos pouca referência às políticas públicas para a
EPTM na atual conjuntura social, seja para indicar divergências entre os
sentidos de educação profissional oficial, docente e institucional ou indicar o
conhecimento sobre sua influência na definição de finalidades educacionais.
Outros rememoraram suas trajetórias acadêmicas e profissionais para dar sentido
ao discurso sobre a sua prática e a partir daí projetarem suas ambições para a
formação técnica.
Em relação às perspectivas de qualidade do ensino de
ciências no âmbito da EP, conseguimos captar uma tendência no sentido da defesa
de um ensino de ciências crítico-reflexivo que instigue o questionamento diante
do conhecimento. O ensino de ciências também foi problematizado mais
radicalmente pelos professores a partir de questões políticas, sociais e
históricas que tocam a soberania e a não neutralidade da ciência engendradas
pelas relações de poder presentes nos contextos de sua produção.
O exame das aproximações e afastamentos entre as
perspectivas de qualidade dos professores de uma mesma instituição apontou mais
aproximações no contexto da escola B. Uma vez que o conceito teórico de
formação integral, defendido pelos docentes enquanto qualidade, fundamenta o
projeto político pedagógico da escola B, é fácil ver a aproximação. Se levarmos
em conta que essa mesmas bases teóricas foram apropriadas pelo Documento Base
para a EPTM (2007), ainda que saibamos da existência de sentidos contraditórios
que possam habitar uma mesma palavra, é possível ver também aí, aproximações
com o discurso oficial do governo. Além disso, encontramos nessa escola,
indícios de um esforço coletivo que aproximou as perspectivas de um sentido
próprio para a qualidade, mesmo que as apropriações incorporem ressignificações
dos valores, intenções e interesses dos sujeitos envolvidos.
No primeiro estudo, realizado com docentes de nível
médio regular, foi consensual e recorrente o sentido da falta de qualidade
atribuído à educação científica. Já os professores da EP construíram sentidos
para a qualidade a partir dos valores que defendiam para o seu ensino,
produzindo sentidos para as suas práticas em meio a embates e buscas pela
qualidade que idealizavam. Talvez na voz desses docentes, tenhamos identificado
uma pista que afasta as perspectivas de qualidade da educação pública de nível
médio daquelas da qualidade da EP. Embora o maior investimento do governo nesta
modalidade nos últimos anos possa explicar parte da diferença, acreditamos que
o critério único de qualidade imposto recentemente pelo Ensino Nacional do
Ensino Médio (ENEM) ao ensino médio regular pressiona muito mais as escolas
públicas de nível médio do que as de educação profissional. Tomando o exame
oficial como único critério de qualidade, os professores do nível médio regular
são levados a avaliar seu ensino nas escolas públicas como totalmente
insatisfatório.
O direito ao conhecimento e à reflexão sobre o
conhecimento, defendido para a formação técnica de nível médio por
pesquisadores da educação profissional, foi notado tanto na perspectiva que
defendeu a inserção no mercado de trabalho como finalidade educacional primeira
quanto na perspectiva que incluiu, além dessa, finalidades sociais mais amplas.
Isto pode ter derivado, nos contextos investigados, de dois pontos de vista:
daquele que é fruto de mudanças na concepção de educação, seja pela
escolarização ampliada ou por questões ideológicas e culturais ou daquele ponto
de vista que já assimilou o fato de a sociedade capitalista contemporânea
necessitar de técnicos que, diante das novas configurações científicas e
tecnológicas do mundo produtivo, também estejam preparados para refletir e
decidir. Isso não quer dizer que esteja tudo resolvido, até porque este caminho
não atende à formação para a cidadania. Há de se ficar em sentinela para que
outras formas de EP integradas ao ensino médio, por exemplo, a subsequente e as
parcerias do governo com o sistema S não representem para a rede federal de
ensino, um retrocesso à concepção de educação profissional marcada pela dualidade
entre cultura técnica e cultura geral (FRIGOTTO, 2009). Ou ainda, como nos
alerta Ramos (2008), que não sejamos iludidos por um discurso “ideológico e
dispersivo intrínseco à dinâmica do capitalismo no qual os sujeitos serão
empregáveis dependendo de sua carteira de competências e de suas qualificações”
(p. 71), uma vez que há contraposições em relação à lógica que lineariza a
relação entre formação e emprego.
Se olharmos para nossos resultados como um todo, foi
possível identificar dois polos: de um lado, a educação científica como
preparação da força de trabalho e de outro, como formação integral, para todas
as dimensões da vida. Mas consideramos que foi possível avançar, justamente
quando conseguimos captar nuances dessas perspectivas. Por meio do escrutínio
que realizamos, chegamos a visões de qualidade particulares, que nos mostraram
a importância dos docentes enquanto protagonistas do processo educativo,
capazes de conformar a qualidade, deixando claro que a qualidade da educação não
pode ser vista apenas por índices oficiais como o ENEM e o Índice de
Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB). Nossos resultados deixaram patente o
quanto esta visão reduz a complexidade da qualidade, quando os confrontamos com
o ranking do ENEM 2011 no estado do Rio de Janeiro, segundo o qual as escolas A e B
ocupam praticamente a mesma posição! O sentido dessa classificação para a
sociedade em geral é o de que essas escolas supostamente apresentam a mesma
qualidade. A divulgação recente deste dado nos proporcionou, assim, um
contraponto evidente ao estudo que realizamos. Afinal, conseguimos mostrar que
a qualidade está longe de ter o mesmo sentido para os docentes dessas duas
escolas.
Outro resultado que merece atenção foi a tendência dos
professores entrevistados de cobrarem dos gestores das escolas e não das
políticas para a EPTM por ações e posicionamentos mais efetivos para ensino
técnico. Paralelamente, notou-se um total silenciamento das tensões envolvidas
na atual política de expansão da educação profissional e da problematização das
propostas oficiais de governo na produção de sentidos para a qualidade.
Consideramos esse quadro preocupante porque as perspectivas enunciadas, sobretudo
no contexto da escola A, que participa efetivamente desse movimento de expansão,
se circunscrevem à realidade institucional imediata e deixam de questionar o
contexto político mais amplo. Reconhecemos que posicionamentos críticos são
dificultados por refletirem a luta contra visões hegemônicas vivenciadas no
sistema capitalista e acentuadas por políticas neoliberais.
Perspectivas sobre a utilização das tecnologias da informação e
comunicação e a qualidade do ensino de ciências
Desde a década de 60, a educação geral e a EC, em
particular, têm sido vistas como fatores de sustentação e aceleração do
desenvolvimento científico-tecnológico do país. Por parte do governo, a
aspiração de desenvolver o país tendo a educação como um fator crucial de
melhoramento das forças produtivas para atender às novas exigências do mundo do
trabalho; por parte da população, o desejo de se beneficiar dos recursos
educativos e integrar-se ao novo momento do país, que crescia e se
industrializava.
Como as práticas da educação formal então vigentes não
atendiam às novas demandas produtivas, imprimiu-se certa dose de cientificismo
à prática docente, utilizando-se o discurso científico e as técnicas de ensino
para legitimar a institucionalização dos especialistas em educação e
profissionalizar o ensino. Dessa forma, generaliza-se na educação um movimento
de incorporação de técnicas administrativas, psicológicas e pedagógicas. Nesta
pedagogia, dita tecnicista, o centro de ensino não é mais o professor, nem mais
o aluno, mas as técnicas (SAVIANI, 1984). A partir delas, reorganiza-se o
processo educativo no sentido de torná-lo objetivo e operacional. O ensino
passa a burocratizar-se mediante planejamentos, operacionalização de objetivos,
instrumentos para medir comportamentos observáveis, mensuráveis e controláveis.
Dissemina-se o uso da instrução programada, das máquinas de ensinar, testes de
múltipla-escola, tele-ensino e múltiplos recursos audiovisuais. Na década de
80, inicia-se oficialmente a introdução da informática na educação por meio do
projeto Educom, que projeto visava, além da melhoria da aprendizagem, a
familiarização dos estudantes com a informática, tendo em vista o mercado de
trabalho.
Saltando das demandas econômicas das décadas de 60, 70 e
80 para a atual sociedade globalizada marcada pela inserção das TIC, vale perguntar
de que forma as atuais demandas redefinem o papel da escola a fim de produzir
uma educação de qualidade. A reforma educacional vigente desde o final da
década de 90, ao colocar a centralidade do conhecimento e da tecnologia nos
processos de produção e organização da vida social, institui um novo paradigma,
em que as competências desejáveis ao pleno desenvolvimento humano aproximam-se
das competências necessárias à inserção no processo produtivo. Admitindo-se tal
correspondência entre as competências exigidas para o exercício da cidadania e
para as atividades produtivas, recoloca-se o papel da educação como elemento de
desenvolvimento econômico e social.
Se a ciência e a técnica sustentaram as premissas da
pedagogia tecnicista visando à melhoria da qualidade da educação a fim de
atender às demandas do mundo do trabalho, a inserção das TIC na educação pelas
políticas educacionais vigentes traz a renovação desse discurso e desencadeia
outros discursos. Esses discursos compõem o que Felinto (2005) denominou de
“imaginário tecnológico”, ou seja, “conjunto de representações sociais e
fantasias compartilhadas que informam nossas concepções sobre as tecnologias” (p.
7). Uma das principais representações concebe as TIC como rendição dos
problemas educacionais, capazes de transformar, de forma mágica, o processo
tradicional de ensino em verdadeiras aulas-espetáculo e, desse modo, combater o
desinteresse dos alunos frente aos conteúdos. Assim, a qualidade da educação
seria alcançada pelo “emprego de recursos tecnológicos que promoveriam a
atratividade dos ensinamentos oferecidos aos alunos ou por eles aprendidos sem
uma interferência significativa do(a) professor(a)” (MOREIRA e KRAMER, 2007, p.
1038).
Exemplos da equiparação entre uso das TIC e a qualidade
da educação podem ser encontrados na maior parte dos programas contemplados
pelo PDE (BRASIL, 2007), como por exemplo, E-ProInfo, Formação pela Escola,
Mídias na Educação, ProInfo Integrado, Pró-Letramento, Pro-Licenciatura,
Sistema Universidade Aberta do Brasil e Banco Internacional de Objetos
Educacionais. Assim, do ponto de vista das políticas educacionais, é possível
observar a construção de um discurso que relaciona linearmente o uso da
tecnologia à qualidade da educação. A partir de sua implementação, esperava-se
que essa relação fosse assimilada por todo o sistema educacional.
O discurso que alinha qualidade da educação e tecnologia
tem gerado diferentes apropriações pelas áreas de pesquisa em Educação e de
pesquisa em EC. Na educação científica, os autores em geral defendem as
vantagens das TIC como novos recursos didáticos que atualizam e facilitam o
ensino, motivam ou contribuem para o processo de aprendizagem (veja, por
exemplo, GIORDAN, 2005; SERRA E ARROIO, 2007). Nesses trabalhos, os recursos
computacionais são utilizados para a pesquisa de temas pelos alunos, elaboração
de gráficos, planilhas, obtenção de dados em experimentos, visualização de
imagens e simulações com a finalidade de motivar ou “modernizar” a aula. Na
área de Educação, em contrapartida, encontramos autores que problematizam a
inserção das TIC na Educação (por exemplo, PRETTO, 2001; BARRETO, 2009), chamando
atenção, entre outros fatores, para a necessária recontextualização desses
artefatos, uma vez que são criados em um dado momento histórico e com
propósitos específicos.
Entendendo que a apropriação dos discursos envolve um
processo de diálogo com intenções e valores que acabam por construir novos
sentidos, este estudo problematiza a relação entre o uso das TIC e a qualidade
da educação, por meio da investigação do discurso de uma professora de Ciências
de uma escola com infraestrutura material e pedagógica adequadas para a
inserção da tecnologia na educação. Pelas condições favoráveis dessa escola,
pela aproximação entre ciência e tecnologia na sociedade e pela associação das
TIC à qualidade da educação no senso comum, pressupomos que a apropriação desse
discurso pela professora siga este mesmo sentido. A intenção desse arranjo foi
amplificar qualquer variação que viesse a ocorrer em relação a essa hipótese.
Marina, a professora de ciências entrevistada, ocupa o
cargo de coordenadora da área de Informática Educativa da escola pública
federal onde leciona e também trabalha em uma escola privada. A professora fala
a partir dos seus 30 anos de experiência no magistério público e privado e como
mestre em Educação. Dirige suas respostas à pesquisadora, professora de
Informática Educativa do mesmo colégio público em que atua. Embora nosso
interesse estivesse voltado para a realidade dessa escola, percebemos que em
alguns momentos Marina alterna sua fala referindo-se também à escola privada em
que atua. Em seu diálogo com a linguagem social típica de suas vivências
profissionais e com outras linguagens como a discente, a do currículo, a
acadêmica e outros discursos atrelados às TIC, foram atribuídos sentidos à
relação entre as TIC e a qualidade da educação.
Inicialmente, Marina se declara subordinada ao currículo
da escola, aos padrões e às decisões do seu departamento disciplinar e se
apropria da palavra de autoridade dos documentos oficiais para justificar sua
prática pedagógica. O livro didático e as TIC são vistos por ela como
ferramentas para melhorar o desempenho do aluno e potencializam assim, sua
concepção de ensino de qualidade.
Os sentidos atribuídos às TIC pela professora as
concebem enquanto recursos didáticos, se aproximando assim, de grande parte dos
resultados de pesquisa encontrados na literatura em EC. Essa visão também
dialoga com o projeto político pedagógico de sua escola, que concebe a
informática como recurso para aprofundar o aprendizado e possibilitar
novas estratégias de aprendizagem. A melhoria da qualidade do ensino é assim associada
à variedade de recursos utilizados para aumento da motivação, sendo as TIC
consideradas enquanto um desses recursos. Esses sentidos atribuídos às TIC são
respaldados pela racionalidade técnica, que associada ao incremento desses
aparatos, representa a melhoria da qualidade da educação científica e reforça o
ensino tradicional e propedêutico.
Marina afirma que faz uso dos recursos que a escola tem
para lhe oferecer. Tal afirmação nos sugere que toda a infraestrutura da escola
pública em que atua como laboratório de informática e sala de ciências equipada
com recursos audiovisuais e de laboratório de ciências, poderia ser utilizada
pela professora, o que não acontece. Talvez pelo fato do seu destinatário real ser
professora de informática educativa, Marina tenha tido necessidade de
justificar que apesar de usar outros recursos, não faz uso do laboratório de
informática porque ele é muito demandado por outras disciplinas.
Entendemos essa negação como uma contradição com sua
própria voz. Entretanto, a professora modaliza essa contradição ao usar o verbo
procurar (“procuro utilizar”), o que nos permite supor, que há recursos que ela
não utiliza, como no caso, a informática. Para justificar o motivo pelo qual
não utiliza os recursos da informática, levando em conta seu destinatário real,
ela pressupõe que o laboratório (“coitado”) é muito solicitado por outras
matérias. Em sua justificativa observamos duas marcas de dialogicidade: a
pressuposição e a ironia. Na pressuposição, a locutora da enunciação está
tomando como tácito que o laboratório de informática é muito demandado pelas
outras matérias, o que não é verdadeiro. Nesse caso, podemos entender que a
pressuposição tem intenção manipulativa, para amenizar o fato da professora não
fazer uso e ter que admitir isso para a entrevistadora. Ela ainda lança mão da
ironia para reforçar sua justificativa.
Perguntada sobre a contribuição das TIC para o ensino, Marina
responde que, quando comparada à da prova, sua contribuição é limitada, já que
nessa comparação, a professora passa a considerá-la como “pequenininha”. Seu
discurso reflete a realidade da escola, que atribui sete pontos à nota da prova
e três pontos às atividades complementares, que incluem aquelas relacionadas à
informática educativa. Sua voz é assim, moldada pelas normas de avaliação,
tomadas por ela como discursos de autoridade.
Embora a pergunta tenha focado as atividades realizadas
com a informática educativa, Marina generaliza a resposta. Apesar de receber o
“produto final” das atividades feitas por meio da informática para avaliar, ao
colocar essas atividades junto com outras em um mesmo bloco, a professora deixa
transparecer o desconhecimento do processo de realização dessas atividades. Sua
concepção sobre as TIC na educação é, enfim, resumida a “uma coisinha”, uma
“atividade pequenininha” frente à atividade em sala de aula. Este sentido
atribuído pela professora fica claro quando ela a compara à prova, chamando
atenção para a diferença de seu valor em relação à real avaliação da
aprendizagem. As qualificações das TIC no diminutivo, assim como a entonação
expressiva empregada ao pronunciar a palavra prova (“prooooooova”) nos dá
indícios do seu acento valorativo para essas atividades. Segundo ela, a
menor cobrança do desempenho no laboratório de informática seria justamente o
que agradaria aos alunos, por se diferenciar do sistema de cobrança comum à
escola. Desse modo, a professora admite que essas atividades contribuem apenas para
a aprovação do aluno, desvalorizando outros aspectos significativos, que
poderiam, de fato contribuir para a qualidade da aprendizagem.
Observamos também que seu ponto de vista sobre a relação
das TIC com a qualidade do ensino é relativizado de acordo com o lugar social a
partir do qual seu enunciado é produzido. Assim, referindo-se à escola pública,
admite que se o professor é “excelente academicamente e passa o conteúdo muito
bem sem utilizar as TIC”, a qualidade do seu ensino não é subtraída. Já na
escola privada, ela enfatiza que os recursos “são realmente para manter a
qualidade do ensino” e os professores são obrigados a usá-los. Os ecos
dialógicos embutidos nesses enunciados nos permitiram apreender diferentes
sentidos da relação entre as TIC e a qualidade da educação científica e
compreender que essa relação é conformada, no seu discurso, pelas diferentes
realidades educacionais e sociais em que as TIC estão inseridas.
Recontextualização da qualidade da educação em ciências em diferentes
realidades educacionais
Com o apoio do quadro teórico proposto por Bernstein (1996), a relação entre o que é
proposto pelos documentos oficiais e o que se pratica em sala de aula é
estabelecida a partir de embates entre concepções políticas e econômicas
diferenciadas, que permeiam a sociedade. Esta percepção está de acordo com a
ideia de que o discurso oficial é sempre objeto de reinterpretação pelos
agentes do campo de reprodução com vistas à adequação à cada realidade escolar.
Neste sentido, as políticas curriculares não se resumem apenas aos documentos
escritos circulantes no campo da educação, mas são produções para além das
instâncias governamentais. Isso não significa, contudo, desconsiderar o poder
privilegiado que o Estado possui na produção dos sentidos das políticas
curriculares, mas considerar que as práticas e propostas desenvolvidas nas
escolas também são produtoras de sentidos para tais políticas.
Os discursos da qualidade da educação moldados pelas
reformas educacionais dos anos 90, principalmente pelas políticas curriculares,
são referência para o sistema oficial de avaliação, que engloba todos os exames
oficiais, entre eles o ENEM. É possível considerar os PCNEM como o documento
que representa o conjunto dessas políticas e a referência para a qualidade
oficial da educação científica. Elaborados a partir dos princípios da Lei de
Diretrizes e Bases da Educação Nacional (BRASIL, 1996), os PCNEM orientaram a
construção de um novo delineamento para o currículo do nível médio, ligado às
exigências contemporâneas e adotando como referencial a contextualização do
conhecimento, sendo as disciplinas agrupadas em áreas de acordo com suas semelhanças.
Apoiado em habilidades e competências básicas, os PCNEM têm como objetivo
preparar o estudante para a chegada à vida adulta e para o exercício pleno da
cidadania. Foram implementados no ano de 2000, no governo do presidente
Fernando Henrique Cardoso, e constituem um projeto governamental de reforma
curricular aprovado pelo Conselho Nacional de Educação. O documento cumpre um
duplo papel de difundir os princípios da reforma pretendida e de orientar os
professores na busca de novas abordagens e metodologias, tendo sido formulado
não como um receituário ou como uma lista completa e exaustiva de conteúdos ou
tópicos a serem abordados, mas visando à vida individual, social e
profissional, atual e futura, dos estudantes. Surgem com a proposta de
direcionar e organizar o aprendizado no ensino médio, a fim de gerar um
conhecimento real, com significado próprio, não apenas voltado para o acúmulo
de informações.
A partir do referencial teórico e dos procedimentos
metodológicos brevemente descritos anteriormente, tomamos como objeto de estudo
os sentidos das políticas curriculares e da qualidade da educação científica
recontextualizados no discurso pedagógico de professores de escolas que diferem
quanto ao índice oficial de qualidade no sentido de compreender como se dão
estas relações. Visto que estamos interessados em ter indícios do discurso
pedagógico dos professores, nosso foco serão os processos de recontextualização
instituídos por eles, procurando mostrar como suas ideologias são comunicadas e
transmitidas no contexto educacional em que estes sujeitos estão inseridos.
O contexto da pesquisa foi constituído por duas escolas
públicas estaduais localizadas em bairros de classe média baixa do subúrbio do
Rio de Janeiro: uma de ENEM alto (escola A) e outra de ENEM baixo (escola B). A
escola A recebe alunos da rede municipal de ensino a partir de uma seleção que
leva em conta o desempenho do aluno durante o segundo segmento do Ensino
Fundamental e dispõe de um convênio com uma instituição federal de ensino
tecnológico, o que lhe confere um ambiente educacional diferenciado em relação
às outras escolas da rede pública estadual. A escola B está localizada próxima
a comunidades carentes e oferece ensino noturno regular. Por estas
características, recebe alunos trabalhadores, sendo grande parte constituída de
adultos.
Entrevistamos seis professores: um professor de Física,
um de Química e um de Biologia da escola A (nomeados de Física-A, Química-A,
Biologia-A) e um professor de Física, um de Química e um de Biologia da escola
B (nomeados de Física-B, Química-B, Biologia-B). O primeiro contato com os
entrevistados aconteceu por intermédio da direção das escolas. As entrevistas
foram gravadas após manifestação de sua autorização, por meio da assinatura do
termo de consentimento livre e esclarecido.
As professoras da escola A têm em comum a queixa a
respeito da redução da carga horária destinada às disciplinas científicas, o
que as faz recontextualizar a proposta curricular estadual, selecionando
conteúdos disciplinares específicos em função do que é exigido pelos exames
oficiais. Os professores da escola B também consideram que a falta de tempo
prejudica a qualidade do ensino de ciências, mas recontextualizam a proposta
curricular estadual principalmente em função das precárias condições de
aprendizagem dos estudantes, adotando a contextualização dos conteúdos como a
melhor forma de atendê-las.
Assim, a tensão entre seguir o currículo oficial das
disciplinas científicas e alterá-lo para atender à realidade escolar, observada
no discurso dos professores investigados no primeiro estudo, também moldou o
discurso dos professores pesquisados no presente estudo. Consideramos que
avançamos ao poder associar cada polo da tensão a um determinado grupo: na
escola de alto ENEM, os professores seguem o currículo oficial e priorizam os
exames oficiais, enquanto na escola de baixo ENEM, eles adaptam o currículo às
condições de aprendizagem dos alunos.
Coerentemente, para as professoras da escola A, a
qualidade é medida com base nos resultados obtidos nos exames oficiais e a
qualidade da sua escola é exaltada ao denunciarem a distância entre sua
realidade e a das demais escolas públicas. Segundo elas, é justamente às
deficiências das outras escolas bem como a aspectos sociais, que se deve a
falta de qualidade do ensino de ciências dos dias de hoje.
Para os professores da escola B, a qualidade da educação
se configura, inicialmente, a partir da desqualificação da sua escola em
relação às demais escolas públicas ou privadas, em função da falta de condições
de aprendizagem da clientela. Atrelam o sentido de qualidade à qualidade
oficial dada pelo vestibular e justificam a falta de qualidade da sua escola
pelo determinismo socioeconômico que atinge irremediavelmente os estudantes.
Apesar das diferenças entre as realidades pesquisadas, o
sentido de qualidade atribuído pelos professores de ambas as escolas à educação
científica corresponde ao da qualidade oficial. A qualidade que valoriza o
caráter instrumental e utilitarista da educação, evidenciado principalmente
após a lei 5692/71 (BRASIL, 1971) e ratificado pelas reformas educacionais dos
anos 90, parece ter sido assimilada. Dessa forma, a educação e a educação
científica mais ainda, são assumidas como preparação da força de trabalho e não
como práticas formativas para todas as dimensões da vida. Nessa perspectiva, a
qualidade do ensino passa a ser medida pelo quanto esse ensino está atendendo
às exigências econômicas. Entretanto, percebemos diferenças no processo de
recontextualização desse discurso, conformadas pela realidade sociocultural de
cada escola.
A posição superior alcançada pela escola A no ENEM
reflete a aproximação do currículo aos conteúdos cobrados pelos exames oficiais,
promovida pelos professores. Na escola de baixo ENEM, os professores, apesar de
aceitarem como meta o padrão de avaliação oficial, não conseguem pautar sua
prática por este padrão, seguindo caminhos alternativos. Na diferença entre os
processos de recontextualização curricular que instituem, o conceito de
contextualização, um dos que alicerçam os documentos curriculares referentes ao
ensino de ciências, presente no discurso dos professores de ambas as escolas, é
recontextualizado de diferentes formas. Na escola A, os conhecimentos
contextualizados podem representar uma forma de fazer com que o conteúdo de
cada disciplina seja enriquecido ou atrelado à formação para o trabalho. Na
escola B, o discurso da contextualização é recontextualizado como solução para
a falta de condições de aprendizagem da clientela, as quais não permitem o investimento
na preparação para o vestibular ou para o mercado de trabalho. Os professores
se preocupam em integrar os conteúdos científicos a questões da realidade
concreta dos alunos (como por exemplo, trazendo informações sobre o corpo
humano que ajudem na prevenção de doenças e na promoção da saúde), sem
reconhecer este processo como garantidor da qualidade do ensino de ciências. Neste
caso, a contextualização parece desempenhar o papel de prêmio de consolação.
Assim, a contextualização dos conteúdos científicos,
estratégia de ensino recomendada pelos PCNEM, pode tanto desempenhar a função
de enriquecer a prática dos professores em uma dada realidade, quanto, em
outra, viabilizar a prática possível em um contexto escolar complexo, moldado
por aspectos socioeconômicos e culturais desfavoráveis.
As políticas curriculares e outros discursos são, desse
modo, recontextualizados por professores das ciências da natureza para compor o
que concebem como qualidade da educação. Embora cientes de que as políticas
curriculares sejam recontextualizadas de diferentes formas pelos grupos
disciplinares (LOPES, 2004), não conseguimos captar tais diferenças, o que
consideramos como um limite do presente estudo e uma motivação para futuras
pesquisas. A análise realizada apontou mais seguramente para a conclusão de que
o discurso pedagógico dos professores reflete realidades educacionais e
socioculturais específicas e se harmoniza com o modo pelo qual as políticas
curriculares são recontextualizadas.
Contribuições dos estudos realizados
A abordagem sociocultural e a análise bakhtiniana do
discurso permitiram considerar as perspectivas docentes como produtos
históricos e culturais e compreender como, em diferentes contextos
educacionais, professores constroem discursos que conformam o processo
educativo e têm impacto na qualidade da educação em ciências que promovem. Por
meio dos estudos realizados, chegamos a visões particulares, que nos mostraram
a importância da relação discursiva dos docentes com suas escolas, com o currículo,
com as políticas curriculares e com as TIC.
Os estudos que realizamos nos mostraram, por exemplo, a
importância da relação discursiva dos docentes com o projeto político
pedagógico de suas escolas. Foi possível relacionar a heterogeneidade de
perspectivas de qualidade à ausência de apropriação de um projeto pedagógico
coletivo da escola. Este resultado sugere que o processo de formação docente
deve ser visto como integrado à atuação docente, considerando a dimensão
formativa da discussão entre todos os integrantes do corpo docente e seu
potencial em moldar perspectivas de qualidade para determinada realidade
institucional. Essa inovação se desdobra na necessidade de maior investimento
nas escolas de nível médio e nas condições salariais dos professores, propiciando
tempo adequado para que os professores dialoguem, negociem e atualizem um
projeto coletivo que seja produto de todos.
O grupo focal com
professores de nível médio sobre qualidade educação revelou a recorrência do
sentido da falta de qualidade atribuída à educação pública e privada e, em
particular, ao ensino de ciências. Esta falta de qualidade foi atribuída a
problemas pedagógicos e políticos. Em geral, os professores se utilizaram da
linguagem social típica de sua vivência escolar, em enunciados apartados
daqueles nos quais se referiam aos aspectos políticos, sempre ligados à
legislação educacional. Embora os professores reconheçam relações entre a
educação e a esfera política, percebemos, nas perspectivas dos docentes de docentes de
nível médio regular e assim como nas entrevistas com os docentes da EP, o não
reconhecimento do caráter político inerente ao ato educativo e a falta da
problematização das políticas educacionais na produção de sentidos para a
qualidade. Considerando esse quadro preocupante, concluímos que os processos de
formação docente (inicial e continuada) necessitam ir além de conteúdos
específicos das disciplinas científicas e serem reorientados para questões
políticas e sociocientíficas a serem enfrentadas por toda a humanidade.
O caso da professora de ciências e coordenadora da
Informática Educativa de uma escola pública federal com amplas condições de
infraestrutura para o uso das TIC na educação, que além de não se apropriar
destes recursos em sua prática, admitia papéis diferentes desses recursos na
qualidade do ensino em escolas públicas e privadas, pode ser um indício da
complexidade que está envolvida nos esforços sempre árduos e na maior parte
infrutífero de levar os professores a se apropriarem das TIC. A abordagem sociocultural
e discursiva parece ser um caminho promissor para compreendermos melhor estas
dificuldades.
As relações que encontramos entre recontextualização das
políticas curriculares e qualidade da educação mostraram, entre outros
aspectos, que a contextualização dos conteúdos científicos pode tanto
enriquecer a prática pedagógica dos professores em uma dada realidade, quanto,
em outra, representar um caminho para viabilizar uma prática possível em um
contexto escolar complexo, moldado por aspectos socioeconômicos e culturais
desfavoráveis. Neste caso, os professores passam a ver a
contextualização de conhecimentos não como incremento da qualidade do ensino
mas apenas como uma alternativa para lidar com a difícil realidade educacional
que enfrentam.
Destacamos como resultado fundamental para alimentar a
discussão sobre a qualidade da educação científica, o discurso docente que
tenciona suas finalidades em dois polos: de um lado, como preparação da força
de trabalho e de outro, como formação integral, para todas as dimensões da
vida. Tomando o estudo realizado no contexto da educação profissional como
emblemático por girar em torno dessa tensão e mostrar nuances entre estes
polos, é possível argumentar que a educação científica e a qualidade da educação científica está longe de ter o mesmo sentido para os
docentes e para a educação de seus alunos e não pode ser vista apenas pelos
índices oficiais de avaliação.
Ao deixar de considerar a complexidade das realidades
educacionais e pautando-se apenas pelos índices oficiais, as ações políticas se
empobrecem. A partir dos estudos realizados fica clara a necessidade de
alimentar as políticas educacionais com pesquisas que analisem criticamente o
que dizem e pensam os professores em serviço, e futuramente, que venham a ouvir
alunos, pais de alunos e a sociedade em geral sobre os sentidos de qualidade da
educação. Isto não quer dizer que possamos abrir mão de conhecimentos e
habilidades básicas, mas que a qualidade da educação científica não pode se
restringir ao conteúdo e ao desempenho em exames oficiais.
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